Big Magic Mamma – Pedra Riscada – São José do Divino/MG, Brasil

Após o lançamento do Guia de Escalada da Pedra Riscada fiquei estudando e pensando qual seria uma via interessante pra fazer lá, após já ter tido oportunidade de escalar algumas no local.

Fazia tempo também que tentávamos marcar uma escalada na Riscada com o Marcel, que ainda não conhecia, então finalmente tudo se alinhou e fomos nós três, Otto, Marcel e eu pra uma via inédita para os três, a que nos chamou a atenção foi a Big Magic Mamma (D6 7º VIIIb 930m) na face sul.

Face Sul da Pedra Riscada

Segundo o guia não havia nenhuma repetição, mas o croqui resumido dos conquistadores estava disponível, bem como o traçado que está bem fiel. Na internet também não encontramos nenhum relato muito detalhado da conquista. As informações que tínhamos eram que a proteção era boa, toda fixa, e que os oitavos não eram obrigatórios mas tinham lances de até 7c entre chapas.

Não temos portalege, mas pelas fotos vimos um grande platô de mato próximo a P3, então nossa estratégia foi subir as três ou quatro primeiras enfiadas pesados (água pra 2 dias, comida, duas cordas extras e equipamento de bivaque), montar acampamento por lá e fixar mais mais 4 enfiadas acima do platô, pra no segundo dia jumarear com as mochilas pequenas e escalar as 11 enfiadas restantes, rapelar e na pior das hipóteses dormir de novo no platô ou na base.

No sábado o objetivo era curto pra um dia inteiro de escalada, então acordamos às 6h na cidade, tomamos um café tranquilos e seguimos pra Pedra Riscada. Chegamos na casa do senhor Ronaldo (novo proprietário da fazenda que dá acesso) que nos recebeu muito bem, nos indicando o melhor caminho por uma sequência de lajedos até a mata “próximo” à base. Não há trilha bem definida, algumas partes de capim e próximo a rocha, mata alta. As referências pra base são a linha de água que escorre à direita da via, e próximo a base um teto a cerca da 30m de altura à esquerda da via (esse teto fica encoberto olhando de longe, só da pra ver bem próximo já), a primeira chapa é baixa e fica atrás de uma árvore grande, o nome da via pintado de vermelho na base já está quase apagado. Levamos 1h30 caminhando até a base, onde chegamos às 11h30.

Começamos a escalar ao meio dia, eu guiei a primeira, com boas e sólidas agarras, Otto a segunda e Marcel a terceira. O guia levava uma mochila leve e os participantes jumareavam cada um com um haulbag de 50l. Como foram apenas 3 enfiadas com esse peso preferimos não içar, pois a pedra é bem abrasiva.

Toquei a quarta enfiada e puxei o Marcel, e deixei uma corda fixa pro Otto atravessar em busca do platô. A mata maior era meio inclinada e achamos mais confortável dormir em um pequeno pequeno platô mais próximo à via, couberam os três um pouco irregular mas relativamente bom. Enquanto isso o Marcel tocou a quinta e a sexta enfiada sem maiores problemas.

Chegamos então na base do 8b, a enfiada crux da via, e era minha vez…
Duas chapas no positivo já meio longuinhas e mais uma na base do vertical onde tem uma faixa de agarras meio ocas, mas da pra negociar atravessando pra direita até a próxima chapa. Aí começa um negativo leve, onde as agarras são sólidas, costurei a segunda chapa do negativo livrando a queda na rampa e assim que ia fazer o próximo movimento quebrou uma agarra de pé e eu caí, foi tranquilo, não bati em nada, voltei e fiz o lance com regletes médios e umas puxadas fortes, costurando a próxima chapa, que deu a impressão do conquistador ser um cara alto kkkkk. Como já estava perdida a cadena, da chapa já atravessei pras boas agarras na esquerda, costurei mais uma e entrei na canaleta me equilibrando e fazendo força ao mesmo tempo nos micro cristais, exposto a uma queda em diagonal não muito bonita, mas provavelmente no vazio. Entrei na canaleta e segui por mais duas ou três chapas no veneno até a parada.

Exceto pela luta na enfiada do crux atingimos o objetivo planejado pro primeiro dia, fixamos as cordas na P7 e descemos pro platô onde chegamos às 18h.

No domingo acordamos às 4:00 e começamos a jumarear as 5:30, chegando na P7 as 7:00. Otto pegou o bloco das enfiadas 8, 9 e 10. A oitava ele passou rápido, começando pela canaleta e saindo dela pra direita até a parada. Ficamos felizes pois a proteção voltou a ficar relativamente confortável, permitindo fluir mais nas agarras que as vezes poderiam quebrar. A nona enfiada é pela face, e tinha uma chapa escondida atrás de uma bromélia que deu trabalho pra achar, Otto seguiu rápido mas depois reclamou do final mais exposto. A décima enfiada foi tranquila.

Peguei a ponta da corda e segui pela canaleta rasa da décima primeira enfiada, sequência de cristais meio polidos, um pouco duvidosos, e um musguinho pra piorar o cenário. Marcel tocou a décima segunda, um 7b vertical nos cristais roleta russa.

A décima terceira, o segundo crux da via, inicia levemente positiva em pequenos cristais bem protuberantes e vai ganhando verticalidade sempre nesses cristais, até o vertical final que passa por uma faixa que parece arenito. As chapas sempre passando uns 2 ou 3m do pé pode parecer pouco falando de escalada de parede, mas a rocha duvidosa deixava-nos cabreiros e sujeitos a uma grande queda a qualquer momento. Sentimos o psicológico abalado e nos revezamos nessa enfiada pra chegar na parada, de onde decidimos descer, pois a roubalheira estava grande e ainda tinham cinco enfiadas pro cume sendo três delas duras.

Começamos os rapeis as 14:30 (cedo, ainda dava tempo de chegar ao cume com luz) pegamos os haulbags no platô e chegamos na base as 17:30. O rapel foi tranquilo, a corda não enroscou nenhuma vez. Arrumamos as
Mochilas e as 19h estávamos na casa do seu Ronaldo novamente!

A trilha que fizemos pode ser baixada aqui.

Sem dúvida foi uma grande escalada pra nós, um pouco mais desafiadora do que imaginávamos, voltamos pra casa sem cume mas com uma boa história pra contar!

Ficamos pensando e discutindo o que poderíamos ter feito melhor pra ter chegado ao cume, ficam aqui algumas reflexões que talvez ajudem os próximos a tentar.

Tínhamos tempo, então dois dias é um tempo razoável pra repetir a via, descemos porque fritamos a mente. Cordadas mais acostumadas com escalada em cristais, e também a lidar com agarras quebradiças vão fluir melhor que nós e terão tempo pra fazer usando a mesma estratégia. Não digo nem que seja impossível fazer em um dia, mas tem que estar à vontade nesse ambiente.

Pra fazer mais tranquilamente acho que precisa de um portaledge. Não há platôs pra dormir acima da P4, mas algumas paradas acima da P8 estão preparadas com mais chapas pra bivaque, inclusive a P13. Dessa forma teríamos entrado cedo no primeiro dia e dormido mais duas ou três enfiadas acima, diminuindo a quantidade de enfiadas duras no segundo dia.

Se tivéssemos como dormir na P13 e dar tempo de esfriar a mente teríamos continuado também, então 3 dias pode ser uma opção também.

Fixar mais cordas acima e dormir no platô é uma terceira opção que eu não faria, muito jumar pro segundo dia!

Proteções: chapeletas de inox com bolt de carbono, alguns bolts estão oxidados e a maioria das porcas também, que são da grande (17, acho), mas não achamos que estava muito precária a situação AINDA.
As paradas são uma chapa com malha rápida interligada com uma corda na outra chapa, claro que as cordas estavam todas degradadas, reforçamos todas ate P13 com um cordelete ou mosquetão de abandono, mas quem for repetir deverá levar material de reposição também.

Até a sexta enfiada a rocha é mais sólida, escalamos bem confortavelmente essa parte, algo como E2. Apesar de não tem nenhum super esticão e as saídas das paradas serem sempre protegidas pra quebrar o fator, as enfiadas superiores com rocha mais duvidosa (a rocha não é horrível tá, nós que somos frouxos) parecem mais expostas e a chance de algo quebrar inesperadamente é maior. Eu consideraria um E3. Como referência, a maioria das enfiadas que fizemos usa 10-12 costuras, apenas a 13ª usa as 17 que o croqui indica. Comparando com a Viaje de Cristal ela é razoavelmente mais exposta.

Bom, mistério desvendado até a P13, espero que motive uma próxima equipe a concluir a primeira repetição da BIG MAGIC MAMMA! Ficaremos felizes em ter notícias!

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