Conquista da Boiúna – Morro do Olho D’água, Lagedo Alto, Iaçu, Bahia

Na busca por repetir algumas vias pouco frequentadas da região Ítalo e eu tentamos acessar a Cabeça do Velho, em Iaçu, pra tentar escalar a Barba de Velho, conquista do André Ilha da década de 90, mas fomos avisados que o acesso estaria proibido porque um novo proprietário havia adquirido a fazenda, e não queria que ninguém acessasse. Ficaram comprometidos também os acessos das vias “Bola de Fogo” e “Brilho Eterno de Uma Mente sem Lembranças”. Espero que consigamos conversar um dia com o novo proprietário e reverter o acesso da melhor forma, mostrando que nosso interesse é apenas se divertir e desafiar, sempre respeitando o meio-ambiente.

Eis que esse impedimento nos levou a passear pela região, demos uma volta na pedra e pela face oposta do Morro do Olho D’água encontramos as simpáticas Dona Lenize e Dona Lúcia, que moram aos pés da face sudoeste. Elas nos receberam super bem e nesse dia nos permitiram caminhar até a base da pedra, fomos então apenas olhar, já que não tínhamos material de conquista, mas deixamos praticamente escolhida a linha que iniciaríamos em breve.

Algumas semanas depois voltamos com algumas chapas, uma bateria e um jogo de camalots, além da companhia do Marcel Gama, que se juntou à equipe. Conquistamos a primeira enfiada esticando a corda toda, parando num platô escorrido embaixo de uma canaleta rasa vertical. Marcel pegou a ponta da corda e conquistou a segunda enfiada, lidando com lacas mais quebradiças, que o obrigaram a proteger mais, parando nos 35m. Nossa única bateria acabou e descemos.

Ítalo e Marcel na primeira enfiada

Marcel conquistando a segunda enfiada

Compramos a segunda bateria pra ter mais autonomia na conquista, mas não aguentamos esperar  chegar e fiz com Ítalo a segunda investida novamente com uma bateria apenas, onde repetimos as duas primeira enfiadas e entramos na terceira, ainda com um lance vertical no início mas depois seguindo pela canaleta fácil, depois por fora dela, onde as agarras chamavam, até a P3. A quarta enfiada segue por fora da canaleta, na rocha escura e passa por alguns domínios de quinto grau, quinto sup até a p4, onde a parede tomba completamente, e segue por uma rampa até a P5. Finalizamos aqui a segunda investida novamente por falta de bateria, mas nesse dia o sol estava tão quente e nós sem água já, que não seguimos pra caminhada que interliga as duas partes da via, baixamos deixando os 120m iniciais de cordas fixas.

Ítalo na P2 durante a segunda investida

Quarta enfiada

Finalmente com duas baterias e 38 chapeletas, além do velho jogo de camalots na mochila fomos novamente Ítalo e eu com o intuito de terminar a conquista, se possível! Subimos pelas cordas e escalamos as enfiadas superiores, chegando à P5 onde resgatamos a furadeira e subimos caminhando mais uns 100m de costão até chegar no primeiro “cume”, um gigante degrau plano que divide a parede em duas partes. Seguimos o caminho lógico acompanhando o lajedo pra direita, que nos levou à proa do segundo andar, uma parede bem íngreme, com uma canaleta bem destacada, por onde resolvemos seguir. A caminhada é plana e tem 500-600m de extensão, sinalizamos com totens e o tempo de deslocamento médio ficou em 15 minutos.

Caminhando até a base da segunda parte

Abrimos então a sexta e sétima enfiadas de uma só vez, mas devido ao grande arrasto, e a um lance negativo pouco depois da metade resolvemos fraciona-la em 2, batendo uma parada antes do crux. A oitava enfiada segue pela canaleta com lances técnicos e quando as agarras somem de vez, ela sai pela esquerda por uma linha de agarrões, finalizando em aderência pra chegar na parada. Contabilizamos apenas mais 6 chapas disponíveis, e pra aproveitar a bateria e o tempo disponível abrimos mais meia enfiada, constatando que ainda faltava muito pro cume, não adiantaria economizar proteções pq não chegaríamos lá aquele dia. Baixamos com tudo, sem deixar nada pois não sabíamos quando poderíamos voltar. Já era noite quando chegamos ao chão e tomamos uma água gelada deliciosa na casa da Dona Lenize antes de retornar pra Itatim.

Cauí na conquista da nona enfiada

Não tardou mais de 1 semana e nos juntamos os três novamente pra investida final, no dia 15 de abril de 2024. Dessa vez largamos pra trás o famigerado jogo de camalots, que infelizmente não serviu pra nada a não ser deixar a mochila mais pesada, levamos apenas uma bateria e algumas chapas divididas em três pequenas mochilas, além de água, lanche, furadeira, marreta, etc. Escalamos relativamente leves das 8h às 12h40, quando chegamos à P8 pra recomeçar a conquista. O lance onde paramos acabou sendo o crux da via toda, algo em torno de VIIa talvez, em uma parede vertical, depois a enfiada segue mais tranquila até a P9, já bem perto do cume. Ítalo tocou a última enfiada por uma parede vertical reta, com boas agarras, batendo a P10 no cume às 15h.

Ítalo na Primeira enfiada

Cauí na terceira enfiada

 Marcel na sexta enfiada (início da segunda parte)

Cauí na sétima enfiada

Ítalo conquistando a última enfiada

Subimos, curtimos o visual por alguns minutos e começamos a descer, foram cerca de 2h de rapel + caminhada + rapel até a base, onde chegamos ainda com luz.

Marcel, Ítalo e Cauí no cume

Assim concluímos a conquista da Boiúna, até então a maior via da região (Itatim – Milagres – Iaçu – Chapada Diamantina talvez), serpenteando pelas canaletas d’água em busca do caminho mais interessante pra chegar ao cume. A via não oferece nenhuma opção de colocação móvel, portanto, para repeti-la bastam 15 costuras (muitas longas) e duas cordas de 60m pro rapel.

As 100 proteções utilizadas são chapeletas Pingo e Dupla cedidas pela Bonier Equipamentos e pela Associação de Escaladores de Itatim, e os parabolts que também tem um custo elevadíssimo foram adquiridos pela comunidade local através de vaquinha. Sem esses meios provavelmente estaríamos ainda na primeira enfiada da via.

Agradeço aos parceiros de muitas roubadas, que reclamam mas estão sempre lá pra qualquer outra ideia idiota: Ítalo (Miro/Manaus) e Marcel. Agradeço também à SBI Outdoor e à Conquista Montanhismo que estão sempre fortalecendo o trabalho com equipamentos de primeira! E mais uma vez, Dona Lenize e Lúcia que nos deram licença pra podermos escalar em sua propriedade.

Aguardamos ansiosos por novas repetições! A parede fica na sombra no outono e inverno. Veja abaixo os croquis:

 

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