Após um bom tempo de planejamento Otto e eu fechamos a nossa ida à cidade de El Chaltén, na região da Patagônia, Argentina! Nos últimos momentos ganhamos o reforço do Cruel (PR) e seguimos com grande empolgação e curiosidade pra terra das agulhas geladas!
A baudiação foi a seguinte: Recife-Guarulhos-El Calafate (avião), El Chaltén (ônibus).
Chegamos em baixo de chuva e fomos recebidos pelo Cruel que já estava por lá, seguimos pro camping El Refúgio, nossa casa nos 30 dias seguintes.
El Chaltén
Cauí, Otto e Cruel no camping El Refúgio
O dia seguinte amanheceu com o céu azul e um bafafá falando de uma ventana (janela de tempo bom) pro dia seguinte. Alugamos equipos (grampons e piquetas), compramos rango e no mesmo dia subimos pro acampamento Piedra Negra, base pro ataque às agulhas Guillaumet e Mermoz. A ideia era tentar escalar a Guillaumet.
Pegamos uma carona até o Rio Elétrico, ponto de partida pra caminhada de 4 ou 5h até Piedra Negra. Subimos e no final da subida começou a ventar um pouco e nevar, já nos deixando meio assim…
Chegamos no camp, completamente nevado, num frio do caralho montamos a barraca, cozinhamos um macarrão e fomos dormir. Um pouco depois o tempo começou a abrir. No dia seguinte soubemos que a janela não tava pra rocha, as duplas que estavam por lá foram todas pra Amy, uma canaleta de neve na Guillaumet. Como não estávamos preparados (nem com equipamentos nem com a técnica suficiente) pra via resolvemos apenas dar uma caminhada, fomo à base da Brenner, uma das vias de escalada em rocha que pretendíamos fazer, mas que estava toda entupida de neve. Ainda dormimos mais uma noite lá em cima e descemos no dia seguinte, com céu azul, sem vento mas com muito gelo nas vias ainda. terminava o nosso primeiro entento patagônico, sem cume nem via, mas com muita experiência boa!
Piedras Negras
Dia seguinte fomos conhecer as escaladas em volta da cidade, fizemos a normal da Paredón de los Cóndores: Los Dejamos Ahí (6a 170m) e escalamos em um setor muito legal com esportivas técnicas mais à direita da parede.
Otto em Lo Dejamos Ahí (6a 170m)
Depois quase fomos arrancados da parede (é sério!) pelo vento na Vescho Wall, setor de esportivas bem do lado da cidade. Partimos então pro Sector Rojo e entramos em uma viasinha técnica bem legal também.
Otto na Vescho Wall
Cruel no Sector Rojo
O tempo continuava uma merda, mas conseguimos caminhar até a Laguna Torre, de onde deveríamos ver o Cerro Torre, mas tava tudo fechado, viramos as costas e voltamos os 10km até Chaltén. Placa dos Duendes foi a pedida da tarde, esportivas curtinhas de regletera!
O dia seguinte foi bom na cidade e a previsão era de uma janela pros próximos dois dias. Arrumamos as coisas e descansamos pra subir a trilha no primeiro dia da ventana.
Uma caminhada bem mais sossegada, com tempo bem ameno nos levou novamente a Pedras Negras. Montamos a barraca não mais em cima da neve, mas nas tais “pedras negras”, comemos e começaram a aparecer algumas nuvens fechando a visão das agulhas, chegamos a pensar que também não seria dessa vez. O dia amanheceu nublado, mas sem vento, saímos pra tentar a Fonrouge, na Guillaumet (5 6b+/A0 30° 400m), a via de rocha mais fácil da parede.
Piedras Negras sem neve!
Começamos a caminhar antes do amanhecer, subimos a rampa de neve, cada um com uma piqueta e um bastão de caminhada, beirando a parede e chegamos ao início da via, umas 2h após sair da barraca.
Rampa de Gelo pra base da Fonrouge
Ainda meio confusos começamos a escalar, Cruel foi na frente e tocou as três primeiras enfiadas que estavam sinistras, com muito verglas (superfície de gelo sobre a rocha). Depois as nuvens saíram e restou apenas um frio bem considerável, escalávamos de luvas e tínhamos que vestir todas as roupas quando parávamos. Otto guiou a sequência até antes do crux, que ficou pra mim. Passei o 6b+ em A0 (claro né!!) e depois toquei a diagonal mais fotogênica na Patagônia. Mais umas enfiadas com um pouco de gelo entupindo as fendas e chegamos à rampa de neve final. Essa foi uma parte crítica na escalada, hahaha.
Começando o crux
A via é fotogênica, mas o escalador nem tanto…
Decidimos subir a via apenas com uma bota e um par de grampons para nós três, o que implicou na escalada da rampa de neve do final com sapatilhas para Otto e Cruel. Felizmente eu tinha o pé menor e a bota mais leve, fui então sorteado pra guiar devidamente equipado esse trecho. Foram duas enfiadas nessas condições, com a seg na piqueta enterrada na neve, que chegamos ao cume da Aguja Guillaumet!!
Trecho final da rocha
Nós no cume da Guillaumet!!
Demos uma relaxada no cume e logo começamos a descida: rapelamos a rampa de neve e começamos os rapéis da via. Se todos estivessem de bota poderíamos ter descido em poucos rapéis a Amy, mas devido à nossa “estratégia” acabamos tendo que fazer o dobro de rapéis pela própria Fonrouge. Chegamos na base da via e não encontramos os equipos! Depois de um bom tempo procurando, andando na neve pra lá e pra cá de sapatilhas ainda, encontramos os equipos, resgatei as botas dos broders e rumamos pra uma ancoragem que tinha onde começamos a escalada. Montamos um rapel e descemos a rampa de neve do início, que era mais ingrime que a do cume, de modo que continuamos rapelando por ela até chegar no chão, usando algumas paradas (blocos de pedra laçados) que encontrávamos, outros que o “Capitão” Otto ia montando.
Depois mais algumas horas caminhando de noite pela moraina (pedregulhos e cascalheira), dando alguns perdidos até chegar no acampamento de novo, onde pudemos comer e dormir tranquilos.
A ideia era dormir até tarde no dia seguinte e descer tranquilo p/ Chaltén, mas às 6h da manhã acordamos com o teto da barraca batendo na nossa cara! O vento tava sinistro! Desmontamos tudo correndo e baixamos, felizes!!
Bicho estranho
No dia seguinte descansamos. Estava rolando uma conversa sobre uma janela logo em seguida, não botei muita fé e fui com o Vitório e o Arthur escalar no setor de esportivas que tínhamos ido antes, escalamos bastante até às 21h (com luz do sol!) e quando cheguei no camping de volta encontrei um par de grampons dentro da minha barraca: o dia seguinte seria de empreitada agulhística novamente!!
O objetivo era tentar o El Mocho, uma “agulha sem ponta” na base do Cerro Torre. O esquema era praticamente o mesmo: andar um dia, dormir e escalar no outro, mas nada é tão simples assim.
Saímos na hora do almoço pros mais de 20 km até o acampamento conhecido como Niponino, um lugar incrível que fica entre os cordões do Fitz e do Torre, no meio das montanhas e dos glaciares. Andamos até a Laguna Torre de onde vimos o Mocho congelado, parecendo um picolé gigante, pensamos até em voltar, mas decidimos continuar, já sem muitas esperanças. Cruzamos a tirolesa e continuamos andando até chegar no glaciar, que atravessamos antes do lugar certo, o que nos fez andar muito pela direita em cima de pedras de todos os tamanhos por muito tempo até finalmente chegar no Niponino, onde armamos a barraca de 2 pessoas pra que nós 3 dormíssemos.
Já estávamos esperançosos pois o tempo tava ficando bonito, mas depois da janta caiu uns bons cm de neve, foi quando vimos que a escalada tinha miado, muitas cordadas de 6b com neve não tava pra gente…Poucos que estavam no camping escalaram alguma coisa, acordamos e voltamos p/ “casa”.
Voltando do Niponino, Mochito, Mocho e Torre ao fundo!
Cheguei do Niponino e comi um pão com salame dormido que junto com o esforço dos dias anteriores não me caiu bem, passei uns três dias meio ruim com febre e corpo mole.
Mas após a recuperação, rolaram várias escaladas na cidade, La Botella (6b 150m), setor da Burbuja com esportivas negativas com agarrões irados, intercalados com dias de mau tempo.
Mais uma janelinha meia boca vinha pela frente, como até agora nenhuma janela generosa tinha rolado, essa agora também não deveria ser grande coisa, escolhemos então uma escaladinha bem legal e rápida pra fazer, o Cerro Solo!
Colhemos alguns betas do Daniel, do Arthur e da galera do camping que já tinha feito o Solo antes e colocamos meia corda na mochila, algumas roupas de frio, um par de piquetas e grampons pra cada um e um pouco de comida. O Ralf se juntou a nós fomos em 4 pessoas.
Saímos de chaltén às 0h, após uma noite com pouco mais de duas horas de sono. Seguimos até a Laguna Torre, a 10 km de Chaltén, mas sem muito desnível sob o comando do Capitão em um sistema militar de caminhar 1h e parar 7 minutos, revezando a corda a cada parada. Começamos então a subida da moraina e chegamos finalmente no neveiro, já bem alto. Começamos o neveiro às 6h da manhã, de onde vimos o sol nascer! Após um trecho de caminhada na neve, que estava em ótimas condições, chegamos ao trecho mais técnico, ensaiamos as primeiras “piquetadas” e tocamos os 60m? de 60°, parte mais técnica da escalada, pra depois continuar caminhando até o cume, onde chegamos às 8h da manhã. Algumas fotos no cume e começamos a baixar! A descida foi divertida, na neve caímos em algumas gretinhas com a neve já mais derretida e quando chegamos no rio mais em baixo fazia sol e até um pouco de calor! Fizemos uma pausa e tocamos os penosos quilômetros do De Agostini até Chaltén, onde chegamos às 15h30.
Cerro Solo
Ralf, Otto, Cauí e Cruel. Cume do Solo!
Tempo ruim, boulder, esportivas, via dos diedros, placa dos duendes, descanso e pra finalizar rolou uma escaladinha muito massa com o Ralf: Ojo Roto (7a+ 150m). Uma via aberta pelo Vitório num desmoronamento que teve anos antes no Paredón de Los Cóndores, cinco enfiadas: Móvel 5+/ Esportiva Pinças estranhas, negativa 6c+ (lazarenta)/ Esportiva técnica 6b (incrível)/ Esportiva técnica 6b/ Mista 7a+ (diedro perfeito entupido de terra, muito boa pra limpar e trabalhar depois). Escalamos democraticamente revezando as enfiadas, e a última cada um guiou um pedaço.
Boulder
Ojo Roto (7a+ 150m)
Otto se foi após o Cerro Solo, Cruel e eu pegamos o rumo de casa e uma semana depois de irmos embora abre uma janela de quatro dias incríveis!! Ah!!! Sorte de quem ficou, soube que aproveitaram bastante!
Deu pra aprender muito nesses dias por lá, trabalhar a paciência, as pernas e os braços, comer empanadas, milanesas e alfajores (antes do Otto acabar com o estoque da cidade), tomar café (e um pouco de mate), comer dulce de leche e ouvir boas histórias dos amigos que estavam por lá! O lugar é incrível e agora eu entendo porque as pessoas ficam fãs de carteirinha de Chaltén, mesmo tendo um clima tão chato!!
Bom, muito texto e poucas fotos, prometo compensar no próximo post com um mega-vídeo editado pela DCC!
Saludos!